30 de setembro de 2024
Mais um mês de setembro chega e passa, levando consigo os "laços" amarelos das campanhas que enfatizam a importância da vida, da prevenção ao suicídio e da saúde mental. Embora esses temas sejam fundamentais, é essencial lançarmos luz também sobre a saúde mental das pessoas idosas, em especial as pessoas idosas institucionalizadas. No alvoroço dessas campanhas, às vezes esquecemos que essa é uma pauta para todas as estações — de janeiro a janeiro, para todas as idades.
Este artigo foi escrito por Patrícia Alves, psicóloga e supervisora do projeto Rede 3i, a partir das reflexões e discussões realizadas no 3º encontro técnico, que teve como tema central a "Saúde Mental da Pessoa Idosa Institucionalizada". O encontro reuniu profissionais de ILPIs para debater os desafios e as estratégias de cuidado voltadas à saúde mental das pessoas idosas institucionalizadas. A partir dessas trocas, este texto busca trazer um olhar sensível e profundo sobre essa questão tão relevante.
“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana” Carl Jung
Enquanto o foco das discussões sobre saúde mental muitas vezes recai sobre os jovens, é crucial reconhecer que as pessoas idosas enfrentam desafios igualmente profundos, frequentemente negligenciados ou confundidos com questões físicas do envelhecimento. Quando o tema é a saúde mental das pessoas idosas institucionalizadas, o debate torna-se ainda mais complexo e delicado.
É urgente reconhecer que o sofrimento emocional não tem idade. Para as pessoas idosas que vivem em instituições, esse sofrimento pode ser ainda mais intenso, vivenciado em silêncio e, muitas vezes, descredibilizado ou mal interpretado como uma consequência inevitável do envelhecimento.
A saúde mental das pessoas idosas institucionalizadas é um tema frequentemente ignorado, mas crucial para garantir qualidade de vida nessa fase que se apresenta cercada de vulnerabilidades. A institucionalização, embora necessária em muitos casos para assegurar cuidados médicos e físicos, pode provocar impactos emocionais profundos.
As Instituições de Longa Permanência para Pessoas Idosas (ILPIs), desempenham um papel fundamental na promoção da saúde e bem-estar desses indivíduos. No entanto, lidar com os desafios da saúde mental nesse contexto exige uma abordagem multidisciplinar e sensível às especificidades desse público.
A transição para uma ILPI nem sempre é fácil, tanto para a pessoa idosa quanto para sua família e para a sociedade. A mudança de ambiente, a perda da autonomia e, em alguns casos, o afastamento de familiares e amigos podem gerar sentimentos de solidão, abandono e tristeza. Esses fatores, somados a possíveis limitações físicas e doenças crônicas, aumentam o risco de desenvolvimento de problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade.
Além disso, a percepção de inutilidade, muitas vezes exacerbada pelos estigmas associados à velhice, pode comprometer ainda mais a autoestima das pessoas idosas, afetando sua capacidade de se envolver em atividades sociais e cognitivas.
Esses sentimentos de solidão e abandono são legítimos, mas também são reforçados por mitos e preconceitos que cercam a institucionalização de pessoas idosas. É urgente que ressignifiquemos essas percepções, valorizando o acolhimento institucional como um espaço de cuidado, e não de abandono.
Cuidar da saúde mental das pessoas idosas institucionalizadas não é um detalhe ou uma questão secundária frente às demandas físicas. Muitas vezes, o que sustenta a longevidade dessas pessoas são os cuidados voltados para a saúde mental e a conexão com suas emoções, preservando a essência que existe por trás de um corpo que naturalmente envelhece.
Estamos falando de cuidados preventivos e atenção à saúde mental, não necessariamente de doenças mentais, que exigiria um debate mais profundo. Nosso foco aqui é a importância de enxergar o indivíduo em sua totalidade — com suas histórias, vitórias e derrotas, risos e lágrimas.
A promoção da saúde mental nas ILPIs é fundamental para garantir o bem-estar das pessoas idosas que residem nesses locais. Um dos primeiros passos é estimular a participação ativa em atividades lúdicas, artísticas e culturais, o que ajuda a manter as capacidades cognitivas e a criar laços sociais. Interações com outros residentes, cuidadores e familiares são cruciais para reduzir a sensação de isolamento. Além disso, a criação de um ambiente acolhedor, que respeite a individualidade e as preferências de cada pessoa idosa, é essencial. Espaços confortáveis e adaptados às necessidades dos residentes, com áreas de lazer e convívio, contribuem para um maior bem-estar emocional.
Outro aspecto importante é a oferta de apoio psicossocial e terapias. O acompanhamento psicológico e psiquiátrico, bem como terapias ocupacionais, desempenham um papel valioso no enfrentamento das dificuldades emocionais decorrentes da perda progressiva de autonomia. Além disso, a participação da família e da comunidade no cotidiano das pessoas idosas deve ser incentivada, pois a inclusão dos familiares no processo de institucionalização e a criação de redes de apoio promovem um sentimento de pertencimento e valorização. Visitas regulares e a participação em atividades ajudam a fortalecer os vínculos afetivos e sociais.
Por fim, é fundamental que as equipes de cuidado que atuam nas ILPIs sejam continuamente capacitadas para lidar com as questões de saúde mental. Uma abordagem empática e humanizada, que compreenda as necessidades emocionais das pessoas idosas, é essencial para garantir um cuidado integral e eficaz. Assim, as ILPIs podem oferecer um ambiente onde a saúde mental seja tratada com a devida atenção, promovendo a dignidade e a qualidade de vida dos seus residentes.
O Setembro Amarelo nos alerta para o fato de que o suicídio, muitas vezes, é o desfecho de uma dor prolongada e não tratada. E o que dizer das dores acumuladas ao longo dos anos, impressas nas memórias e revisitadas no confronto com a institucionalização?
Por isso, precisamos estar atentos, de olhos, ouvidos e coração abertos, criando ambientes onde o afeto e o cuidado sejam reais. Lugares onde as pessoas idosas institucionalizadas se sintam pertencentes, protegidas e capazes de preservar seus legados com autonomia e dignidade. O convite é para que sejamos uma rede de apoio, não apenas em setembro, mas durante toda a vida, valorizando a saúde mental de todas as pessoas, especialmente as que envelhecem.
Mais do que simplesmente usar laços amarelos em setembro, que sejamos redes vivas de empatia, respeito e cuidado durante todo o ano. Que possamos garantir que cada pessoa idosa, especialmente a institucionalizada, seja ouvida, vista e tratada com o respeito e a dignidade que merecem, hoje e sempre.